A Construção da Imagem e a Imagem Construída
Como se apropriar do discurso racista? Como transcender a denúncia? Como não cair no ressentimento? Como construir um imaginário de liberdade? Na tentativa de restituir uma imagem e dialogar sobre o que é ser negro na sociedade. Como esboçar o movimento de construção da identidade do indivíduo negro na sua relação com os fatos históricos tendo o público como cúmplice e não o afastando com um ato unicamente panfletário? Como construir um espaço de discussão que eleve as questões para além de sua obviedade? E, a questão que ainda permanece, como representar o negro, num jogo em que sujeito e objeto se confundem? Como elaborar este corpo em cena? A partir destas questões o grupo se debruçou sobre a construção da identidade negra, sobre nossa história de luta por liberdade.
Com o apoio da Lei de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, a Cia Os Crespos desenvolveu em 2009 e 2010 um projeto de pesquisa sobre o racismo na história do Brasil e seus desdobramentos na contemporaneidade. O grupo realizou sete intervenções temáticas em diferentes espaços públicos da cidade, investigando a construção da imagem do negro na sociedade contemporânea e qual a relação dessa imagem com o olhar desse indivíduo para si mesmo nos dias de hoje.
O texto “Lembrança de uma revolução: A Missão”, do alemão Heiner Muller, foi o condutor do processo de construção do trabalho. O grupo partiu da obra de Marcelino Freire e textos criados por ele especialmente para algumas intervenções. Também foram usados trechos das obras do poeta pernambucano Solano Trindade, os escritores Cornel West e Ralph Ellison, o líder negro Malcolm X, o ativista político Martin Luther King, o grupo musical Racionais MCs, os compositores Chico Buarque e Vinicius de Moraes, contrapostos a discursos do sociólogo Demétrio Magnoli, do senador Demóstenes Torres, do jornalista da Rede Globo Ali Kamel e do cantor e compositor Caetano Veloso.
A partir do material colhido nas intervenções os atores levantaram as cenas para a realização de um espetáculo em construção que uniu vídeo, música, fotografia e instalação. Um espetáculo inacabado, uma reflexão cênica sobre o conjunto das intervenções. A apresentação teve a atmosfera de uma performance audiovisual, na qual os atores dialogavam com algumas imagens produzidas durante as intervenções e projetadas no espaço cênico. A trilha era executada ao vivo, criando um contraponto com cada cena proposta.